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Um gato que me salta em cima a pedir comida às 7 da manhã. 4 e 7 são 3. Alguém que me pede para lhe ensinar a mandar sms's às 8. 4 e 8 são 4. Às 9 chega a empregada e o seu aspirador, ao qual prefiro chamar conspirador. 4 e 9 são 5. Às 10 desisto de lutar. Mentalizo-me que me deitei à 1 em vez de às 4 e o dia começa. 4 e 10 são 6. Horas de sono, portanto.
Ponho Beirut, em repeat e aos altos gritos. Sempre a mesma música, que me enche de felicidade cada vez que recomeça. O gato foge, o aspirador desaparece e tudo se torna perfeito perante as suas palavras ... A Sunday smile you wore it for a while... E só assim um sorriso é possível, mesmo não sendo Domingo.
Estar em Lisboa é sempre isto: manhãs em que é impossível mergulhar no mundo onírico, por haver uma realidade gritante que me impele para a actividade.
A comparação é forçosa, e dou por mim a recordar as manhãs londrinas, de céus brancos, sem tempo. Sempre iguais: abrir os olhos quando os quero ter fechados, conseguir arrastar o corpo para fora da cama, no silêncio de uma casa onde só os objectos desarrumados falam, tomar um comprimido para dar alma ao corpo. Esperar que o efeito comece e uma hora depois, ainda a bocejar, após muitos cigarros e muitas chavenas de chá meio entornadas por todo o lado, acreditar que a apatia me salvará de mais um dia em que sinto que a minha existência é inútil.
Em Lisboa nada disso acontece. O gato é meigo mesmo quando me chateia; a empregada é afectuosa e prepara-me um pequeno almoço que finjo gostar, incapaz como sou de comer nas primeiras horas da manhã; o céu é diferente, não todo branco, e a ideia que existe um mundo inofensivo lá fora, sem horas de viagem para chegar seja onde for, anima-me.
.. A Sunday smile you wore it for a while... Canta o Zach, quatro, cinco, seis vezes, sem nunca desafinar.